sexta-feira, setembro 23, 2005

"Marca-passo cerebral" pode combater depressão

O marca-passo que age no cérebro e as terapias que influem nos pensamentos irrealistas fazem a pessoa voltar a ter uma vida normal


Nunca se investiu tanto em diferentes recursos terapêuticos para combater a depressão. A grande notícia é que a Food and Drug Administration (FDA), órgão que controla alimentos e remédios nos Estados Unidos, anunciou o uso de marca-passo para quem sofre de depressão severa - pessoas refratárias a mais de três drogas diferentes e cujos sintomas são difíceis de controlar. Parecido com o estimulador cardíaco, e já usado na Europa e no Canadá com bons resultados, o novo marca-passo é implantado na região torácica superior (leia o quadro abaixo). Os impulsos elétricos têm a função de estimular a região cerebral onde se processa a depressão, mais conhecida por sistema límbico. ''Essa técnica é revolucionária, porque será possível atender indivíduos que não respondiam a outros tratamentos'', diz o psiquiatra Evandro Gomes de Matos, coordenador do Núcleo de Atendimento de Transtornos de Ansiedade da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). ''A vantagem é que nem se percebe o impulso elétrico.''

Segundo os estudos avaliados pela FDA, 18% dos pacientes testados se disseram curados com o aparelho; 35% sentiram os sintomas reduzidos significativamente; e 57% tiveram algum benefício após dois anos. Até que o mecanismo seja ajustado, o portador do marca-passo - anteriormente utilizado em casos de epilepsia - poderá ter paralisia temporária das cordas vocais, rouquidão, tosse, formigamento na laringe e sensação de falta de ar. Mas são sintomas leves, que não chegam a desencorajar a adesão à novidade.

Dos 340 milhões de pessoas que sofrem de depressão no mundo, 75% nunca passam por qualquer tipo de tratamento contra a doençal

Fonte: OMS

O aparelho funciona por cinco anos. Depois desse período, os médicos aconselham deixá-lo no corpo, evitando uma nova cirurgia para a retirada. Por enquanto, o maior ''efeito colateral'' é o preço: US$ 20 mil, já incluída a implantação. ''Como são raros os procedimentos remunerados em psiquiatria pelo sistema de saúde ou pelo convênio médico, poucos pacientes terão condições de comprá-lo'', afirma a psiquiatra Helena Calil, professora de Psicofarmacologia da Universidade Federal de São Paulo.

O marca-passo é um grande avanço contra a depressão, mas há outros tratamentos desse tipo. A estimulação magnético-transcraniana é uma dessas novas alternativas. Ela ativa, por meio de ondas magnéticas, determinadas regiões do cérebro, cuja função maior é a modificação do humor. ''É uma linha de pesquisa ainda experimental, que pode ser considerada promissora e, espera-se, vir a ter utilidade na prática clínica'', diz o psiquiatra Ricardo Moreno, coordenador do Grupo de Estudos de Doenças Afetivas do Hospital das Clínicas de São Paulo. No Brasil, a Universidade de São Paulo (USP) vem testando-a com bons resultados. O mesmo acontece nos Estados Unidos. Lá, o FDA acompanha um amplo estudo feito com a técnica em pacientes de todo o país. Se os resultados continuarem a ser positivos, o órgão deverá aprovar seu uso a partir do ano que vem.

AMOR

''Há três anos, quando tive depressão pela primeira vez, fiz um tratamento com remédios, sem resultado. Migrei para a terapia e melhorei bastante. Mais tarde, fiquei sem trabalhar por um ano em decorrência de uma cirurgia no joelho. Afundei novamente. Voltei à terapia e resolvi abrir uma comunidade no Orkut para trocar idéias com outros deprimidos. Por meio do site, conheci minha atual mulher, Aline, que também tentava superar a doença. Nosso amor foi o bote final na depressão. Acabei me mudando para a cidade onde ela morava. Fui atrás da minha felicidade''_____________Fotos: Maurilo Clareto/ÉPOCA

FERNANDO CABRAL, 40 anos, analista de sistemas


ESTILO DE VIDA

''Passei por quatro crises de depressão. Nas três primeiras, tratei-me com remédios. Na quarta, cansada da medicação, resolvi tentar algo novo. Criei o que chamo de método da cegueira voluntária. Peço para o Fernando, meu marido, olhar o mundo por mim, em vez de acreditar na visão distorcida da realidade que a depressão traz. Adotei também uma alimentação mais saudável e me concentro em pensamentos positivos. Agora me sinto curada. Assumi que, na depressão, vejo tudo de forma equivocada. Nem tomo grandes decisões nesse período porque sei que posso querer voltar atrás''

ALINE CABRAL, 29 anos, administradora (foto acima)



"Estas são intervenções sérias para uma doença séria"

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