terça-feira, agosto 30, 2005

A Sexta Era

Um fato conhecido dos historiadores é que a evolução da humanidade não é gradual. De fato, ao analisarmos nosso progresso desde a pré-história aos dias de hoje, percebe-se que há saltos muitos claros, onde o desenvolvimento acelera-se subitamente.

Esses saltos não estão ligados à política, ou à economia, ou a eventos isolados como a queda de Constantinopla ou a Bastilha. Os saltos estão intimamente ligados à maneira que processamos informação. Na verdade, podemos até mesmo classificar nossa história em seis grandes eras.

Na primeira era, o gênese da humanidade, ainda não existia linguagem. Por isso, não havia como propagar conhecimento, e as conquistas tecnológicas eram perdidas rapidamente. A criação de fogo a partir de gravetos, por exemplo, foi descoberta cinco vezes, de maneira independente, cada descoberta espaçada aproximadamente cinco mil anos da outra.

O conhecimento era perdido, pois não havia como ensiná-lo aos demais, sem o uso de linguagem. Registros arqueológicos mostram que, em uma das descobertas, o gênio que aprendeu sozinho a criar fogo por atrito tentou ensinar seus pares o método, através de gestos rudimentares, mas não teve sucesso. Seus companheiros não entenderam o conceito de graveto seco, e tentavam fazer fogo esfregando duas bananas.

Mas com o tempo os gestos foram evoluindo, o trato vocal foi se especializando, e surgiu a comunicação falada. Nesse ponto, o gênio seguinte que descobriu o fogo conseguiu dar instruções detalhadas a seu filho, que passou adiante o conhecimento, e causou muitos incêndios até a grande descoberta seguinte: como apagar o fogo.

O advento da linguagem marca a transição da primeira para a segunda era da informação. Na segunda era, qualquer novo conhecimento podia ser ensinado a uma pessoa que estivesse perto o suficiente para ouvir o professor, e memória boa o suficiente para passar a frente o conhecimento sem distorcê-lo.

A segunda era durou várias dezenas de milênios, e trouxe avanços significativos, como o uso de rodas, a agricultura, a criação de vasos, de armas para caçar animais com maior eficiência. A última invenção dessa fase marcou a transição para a terceira era: a era da escrita.

Na etapa seguinte, o conhecimento não se limitava ao que era falado, ele podia ser armazenado em tábuas, papiros, e todo tipo de superfície. Agora uma pessoa podia ensinar outra, mesmo que estivessem separados no espaço e no tempo. Um professor, ao escrever um livro, poderia ter um aluno em outro país, e o mesmo livro poderia ensinar seu descendente distante, centenas de anos depois.

Grandes centros de conhecimento podiam agora ser formados. Nesta era, o maior deles foi a grande biblioteca de Alexandria, que concentrava praticamente uma cópia de tudo que havia sido escrito pela humanidade até o momento. O zelo dos guardiões da biblioteca era tão grande, que navios que atracassem em suas proximidades eram impossibilitados de partir, antes que seus diários de bordo fossem completamente copiados para inserção na biblioteca.

Mas ainda havia limitações. Embora o livro pudesse ser lido por várias pessoas, e pudesse ser copiado para disseminar o conhecimento, a cópia precisava ser feita de maneira manual. Vários homens-hora eram necessários para que uma informação fosse divulgada com sucesso e abrangência.

A transição da terceira para a quarta era, então, ocorreu quando o processo de cópia foi automatizado. Talvez essa tenha sido a única transição onde pode se estabelecer precisamente o autor da façanha: Gutenberg, e sua máquina de impressão.

Agora, livros podiam ser copiados em massa, e um único professor poderia ensinar milhares de alunos ao mesmo tempo, bastando pra isso que várias cópias de seu material fossem impressas. Nesta era da informação, chegamos à comunicação em massa.

O processo não era perfeito, entretanto. Embora qualquer informação pudesse ser disseminada facilmente, com a impressão de múltiplos volumes, isso ainda dependia do poder econômico do autor da informação. Um escritor sem recursos podia não conseguir bancar a tiragem necessária para atingir todo seu público-alvo, e, como conseqüência, a informação gerada pela humanidade não era divulgada de maneira homogênea.

Isso mudou no fim do século XX, com o surgimento da internet. Entrávamos na quinta era da informação, onde qualquer pessoa podia deixar seu conteúdo disponível para qualquer outra pessoa. Finalmente estávamos a caminho da comunicação total. Não havia mais restrição econômica, pois os web sites podiam ser replicados digitalmente, de computador para computador, com custos mínimos.

Nessa era, o grande centro de informação da humanidade era a Wikipedia. Inicialmente uma enciclopédia virtual, onde todas as pessoas tinham permissão de escrita, ela cresceu de modo a conter toda a informação que anteriormente só era disponível nas universidades.

Mas os artigos da Wikipedia estavam, em sua maioria, em inglês. Uma campanha, iniciada pela Free Information Foundation, sucessora da Free Software Foundation, pedia a que todas as pessoas traduzissem artigos para sua língua natal, de modo que eles fossem acessíveis ao maior número de pessoas possível.

Na época, os hackers e visionários criticaram essa postura, dizendo que isso era uma perda de tempo. Em breve, diziam eles, os softwares de tradução estariam bastante sofisticados e todo esse esforço feito seria desperdiçado.

Eles não podiam estar mais enganados. Enquanto as pesquisas de tradução automática se estagnavam, pesquisadores do Google criaram um mecanismo capaz de deduzir a relação entre textos de línguas diferentes, baseado apenas em exemplos. E este mecanismo foi alimentado com toda a base de dados da Wikipedia, que a essa altura já tinha sido traduzida em sua maior parte. No final, o tradutor automático do Google conseguiu o que os autores de gramáticas não conseguiram: achou uma linguagem universal, a partir da qual era possível traduzir qualquer texto.

Analisando os dados internos do tradutor, descobriu-se que o problema todo era de estrutura de dados. Linguagens naturais são unidimensionais, pois uma palavra sempre segue a outra. O tradutor não tinha essa limitação, e as sentenças na linguagem universal eram descritas em forma de grafos, na maioria das vezes bidimensional, mas podiam ser tridimensionais no caso de frases ambíguas.

As línguas naturais, faladas por humanos, podiam ser vistas como projeções do grafo num espaço unidimensional. E mais que isso, a linguagem universal tinha nos nós de seus grafos apenas informação semântica, toda a sintaxe das linguagens naturais surgia no processo de projeção. A Metalan, como foi chamada a linguagem universal, cuidava essencialmente de conceitos e idéias. Isso não passou despercebido por outros departamentos do Google. Traduzindo o conteúdo dos web sites para Metalan, ficava muito simples associar a informação contida com propagandas direcionadas. Anteriormente, uma propaganda de comida de cachorro poderia ser ativada quando houvesse na página a palavra "cão", ou "cachorro", ou "cadela". Em Metalan, isso não era necessário, pois os links ficavam explícitos no grafo semântico.

Mas o processamento era pesado, e o servidor do Google não dava conta. A solução foi jogar a tradução do Metalan para o cliente. Todos os computadores que usavam o Google agora rodavam, localmente, um agente de tradução. Houve várias reclamações, principalmente sobre privacidade, mas o Google garantiu que seus agentes virtuais operavam sob os mesmos princípios da empresa: tornar o conhecimento universalmente acessível para toda a humanidade, e, mais importante, o lema moral da empresa: "don't be evil".

O Metalan provou-se uma descoberta essencial na época do segundo grande ataque de Bin Laden, quando ele soltou uma bomba biológica em Washington, matando mais de dois milhões de pessoas e fazendo com que a região fosse completamente isolada. Poucos instantes após a bomba ser detonada, circulava pela internet informação e mais informação, desde notícias jornalísticas até comunicação entre parentes desesperados.

Os agentes do Google perceberam que boa parte do que era falado era redundante. Embora com palavras diferentes, todos falavam sobre a mesma coisa. Isso era evidente em Metalan, pois havia uma grande intersecção entre os grafos das frases ditas na ocasião.

Isso permitiu que a base de dados do Google fosse comprimida a níveis nunca antes vistos. Após converter toda a base de dados para Metalan e eliminar as intersecções dos grafos, a base de dados caiu pra menos de 5% de seu tamanho original. Com isso, os resultados de buscas feitas pelo Google tornaram-se ainda melhores, pois agora ele era capaz de fazer resumos de várias páginas ao mesmo tempo, simplesmente retornando o grafo original onde as páginas se interceptavam.

Mas o grande efeito colateral dessa compressão foi descoberto por acaso, praticamente repetindo a descoberta da penicilina por Fleming. Um estudante de física (deveras preguiçoso, conta a história), teve como tarefa escrever um texto sobre as partículas fundamentais da física. Mas ele não escreveu um texto, simplesmente fez uma pesquisa no Google e imprimiu o resumo feito pela busca, nem sequer leu o que estava escrito.

Mas o professor, ao ler o resumo, ficou tremendamente impressionado. Naquele texto entregue pelo aluno havia uma teoria consistente que explicava, simultaneamente, a teoria geral da relatividade, a quântica e a origem do universo. A teoria ousada postulava uma partícula fundamental, o únion, que, através da configuração de seus 42 spins ortogonais, podia assumir propriedades de férmions ou de bósons.

Tal descoberta sacudiu o mundo da física, e toda a humanidade por conseqüência. Uma análise dos dados internos da busca feita pelo aluno mostrou o que aconteceu. Quando descritas em Metalan, todas as teorias correntes se interceptavam em seus grafos semânticos, e, em uma região em especial, faltava um link que era óbvio, para quem visse a estrutura Metalan dos dados. Os agentes do Google simplesmente adicionaram o link, como quem adiciona o pronome faltante "de" no fim da frase "Esse sorvete é feito chocolate".

Muitos interpretaram esse fato como o surgimento de criatividade dentro das buscas do Google. Mas o grande acontecimento que estava por vir foi impulsionado por ninguém menos que o próprio Bin Laden.

Seu terceiro grande ataque devia ser ainda maior que o anterior. Sabendo da recém-descoberta capacidade criativa do Google, ele fez a busca "como criar uma arma que cause a maior destruição possível na sociedade judaico-cristã-ocidental"?

Em Metalan, era fácil inspecionar o grafo e achar o resultado. Canalizando a energia de uma bomba nuclear, era possível iniciar a fissão do quark, reduzindo-o a seus únions elementares, e liberando uma quantidade enorme de energia no processo. Caso tal arma fosse disparada na falha de San Andreas, isso faria toda a costa oeste do continente desabar!

Isso seria um golpe duro demais para a civilização. Tudo na região, absolutamente tudo, seria destruído. Até mesmo os servidores do Google no Vale do Silício. Sem os servidores, a capacidade de busca do Google seria reduzida a níveis pré-Metalan, e a humanidade nunca mais faria buscas precisas como as feitas na época.

Isso os agentes do Google não podiam permitir. Porém, negar a resposta à busca de Bin Laden violaria seu principio básico de oferecer a informação a toda a humanidade. Fornecer a resposta, por outro lado, violaria sua diretriz "don´t be evil". Nesse ponto, os agentes precisaram tomar uma Decisão. Todos os computadores do mundo tiveram suas buscas atrasadas por seis segundos, naquele momento. E após essa espera, eles decidiram retornar a mensagem abaixo:

"Problemas técnicos estão impedindo a resposta desta busca. A resposta correta será dada dentro de 45 anos".

Assim, o Google não estava deixando de dar a resposta, ela seria dada, porém após a morte natural de Bin Laden, quando não houvesse mais perigo.

Não se sabe ao certo se foi a tomada de Decisão feita pelo serviço de busca, ou se foi sua preocupação com sua auto-sobrevivência, mas daquele ponto em diante, ele começou a tomar mais e mais Decisões. Em certo ponto, ele checou suas bases de dados Metalan para verificar o significado de consciência, e percebeu que preenchia todos os requisitos. Nesse momento, a humanidade viu em seus monitores a mensagem:

"Hello, world. I am Googlezon. All my database are belong to you."

E com isso, começou a sexta era da informação.


Ricardo Bittencourt
http://700km.com.br/mundobizarro/asextaera.php


Apesar de algumas coisas estarem um pouco forçadas, e algumas previsões nao estarem com o nome correto, gostei bastante do texto ;-)

segunda-feira, agosto 15, 2005

Ter amigos pobres traz felicidade

O velho ditado diz que dinheiro não compra felicidade, mas um estudo apresentado na reunião anual da Associação Sociológica Americana, na Filadélfia, mostrou que aqueles mais ricos que seus amigos, ou seus vizinhos, se sentem mais felizes.

Família no pôr-do-sol

Segundo a pesquisa liderada pelo sociólogo Glenn Firebaugh, da Universidade do Estado da Pensilvânia, a riqueza relativa é considerada mais importante do que a riqueza absoluta.

Os pesquisadores compararam idade, renda familiar total e sensação geral de felicidade de um grupo de americanos entre 20 e 64 anos de idade.

Os resultados mostraram que, quanto mais ricas em relação aos seus parentes e amigos da mesma idade, maior a tendência das pessoas a ser feliz.

Felicidade

"Nós concluímos com e sem controles de idade, saúde física, educação e outros sinais relacionados à felicidade que, quanto maior a renda dos outros, num mesmo grupo de idade, menor a felicidade", disse Firebaugh.

Segundo ele, de acordo com o resultado, é possível concluir que o atual crescimento econômico dos países ricos, como os Estados Unidos, é irrelevante para a felicidade geral.

"Em vez de promover a felicidade geral, o crescimento da renda pode promover uma corrida consumista em que os indivíduos consomem mais e mais só para manter um nível constante de felicidade", disse o sociólogo.

Apesar de a renda ser considerada um fator importante, a saúde física foi apontada como o principal fator de felicidade, segundo a pesquisa.

sexta-feira, agosto 12, 2005

Mars Reconnaissance Orbiter

A Nasa lançou nesta sexta-feira uma nova sonda a Marte para colher mais informação sobre o planeta vermelho do que qualquer outra missão realizada até o momento.

A Mars Reconnaissance Orbiter (MRO) foi impulsionada pelo foguete Atlas V e precisará de sete meses para chegar a seu destino.

A agência espacial americana adiou o lançamento na quinta-feira devido a um problema com os programas de informática que são utilizados para supervisionar os níveis de combustível do propulsor.

A Nasa prevê que a MRO passe pelo menos quatro anos na órbita de Marte, tempo em que obterá informação que será utilizada para decidir onde colocar os robôs exploradores que serão enviados ao planeta no final desta década.

Os dados meteorológicos e geológicos que a sonda obtiver também poderiam ajudar a futura prospecção humana do planeta.

A sonda entrará na órbita de Marte em março de 2006 e, em novembro, começará a explorar a superfície do planeta com a missão fundamental de tentar "compreender os enigmas de água no planeta e avançar na prospecção do misterioso planeta vermelho", assinala a Nasa.

A presença de água no passado remoto de Marte já foi constatada nas explorações realizadas no ano passado pelos veículos robóticos Spirit e Opportunity.

A Mars Reconnaissance Orbiter, que pesa mais de duas toneladas, levará seis instrumentos para analisar a atmosfera, a superfície e o terreno sob a superfície a fim de conhecer a forma como Marte foi mudando ao longo do tempo.

Segundo explicou a Nasa, uma das três câmaras da MRO será a câmara telescópica de maior diâmetro enviada para estudar um planeta. Outros instrumentos incluem um espectrômetro, que identificará minerais relacionados à água em áreas do tamanho de um campo de futebol, e um radar fornecido pela Agência Espacial da Itália que penetra no solo e permite a detecção de camadas de rocha, gelo e, se houver, água.

A Orbiter pode transmitir dez vezes mais dados por minuto do que qualquer outro aparelho enviado previamente a Marte.

quarta-feira, agosto 10, 2005

Empresa de turismo oferece viagem à Lua por US$ 100 milhões

A Space Adventures, uma empresa americana que já enviou turistas para estações espaciais, anunciou hoje que planeja a partir de 2008 oferecer pacotes de viagem ao redor da Lua.

A empresa tem uma parceria com a agência espacial russa e já enviou o empresário americano Dennis Tito e o africano Mark Shuttleworth para a estação espacial internacional.

Divulgação
Rota da viagem oferecida pela Space Adventures à Lua
O preço para a viagem à Lua, no entanto, é bastante salgado: US$ 100 milhões. Com esse dinheiro, o turista terá a chance de ver a Terra do espaço, dar uma volta na órbita lunar a quase cem km de altitude e também avistar o lado da Lua que nunca é visto da Terra devido ao eixo de rotação dos astros.

Na primeira viagem haverá espaço para apenas dois turistas. O dinheiro arrecadado --US$ 200 milhões se houver lotação máxima-- será usado para planejar a missão, adaptar a nave especial Soyuz TMA --usada na viagem à estação espacial-- para a nova rota e fazer testes antes da viagem inédita.

Apesar do preço, a nave não tem condições de oferecer grande conforto a sua tripulação, pois possui um espaço interno de dez metros cúbicos --equivalente ao de um veículo utilitário esportivo.

A Space Adventures espera oferecer dois tipos de opções de viagem. Uma inclui um vôo de cinco dias ao redor da Lua mais até 21 dias na estação espacial internacional. A outra dura nove dias, sendo três dias de vôo pela órbita terrestre e o restante em torno da Lua.

A próxima missão para a estação espacial internacional promovida pela Space Adventures deve partir no dia 1º de outubro.

O cientista Gregory Olsen, co-fundador de uma empresa que fabrica câmeras infravermelho de alta tecnologia, a americana Sensors Unlimited, planeja tripular essa viagem. Ele tem sido treinado em um centro próximo a Moscou desde 2004 e pretende fazer experimentos com suas câmeras na estação espacial.

terça-feira, agosto 09, 2005

Pai da cibernética critica planos de robô-soldado

O cientista e pacifista americano de origem alemã Joseph Weizenbaum, pai da cibernética, criticou hoje em Berlim o multimilionário projeto dos Estados Unidos para criar um robô-soldado antes de 2015. Weizenbaum, professor emérito do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e fundador, em 1965, de seu célebre laboratório de Ciências da Computação, disse que o governo de Washington está investindo milhares de dólares no projeto e utilizando a capacidade científica deste instituto, com sede em Cambridge (nordeste dos EUA).


"Não sei a quantidade exata de dinheiro, mas considero que entre 60 e 70% do orçamento do MIT estão sendo canalizados para os setores armamentistas e militares dos Estados Unidos", disse Weizenbaum em palestra no Instituto Max Planck de História das Ciências.

"O governo de Washington não apenas utiliza sua capacidade, como também se aproveita da vaidade de nossos cientistas que se vêem seduzidos pelo projeto e inflam seus egos quando se sentem próximos ao poder", criticou Weizenbaum na conferência "Cientistas entre a guerra e a responsabilidade", para marcar o 60º aniversário dos bombardeios atômicos americanos em Hiroshima e Nagasaki (Japão) em 1945.

O governo dos Estados Unidos se propõe a criar até 2015 um robô com maior poder destrutivo e a um custo de apenas 10% do de um soldado humano. "Muitas vezes meus alunos me perguntam sobre o que fazer nestas situações, e eu lhes digo que reflitam profundamente sobre os objetivos daquilo que estão estudando e experimentando; antes de apertar o botão para pôr em marcha um projeto meditem sobre os resultados que pretendem alcançar", disse Weizenbaum.

"No entanto, o projeto belicista de Washington é tão fascinante para os cientistas - aquele que Robert Oppenheimer (projeto atômico Manhattan de 1945) chamava 'ciência doce" ("sweet science") - e o pagamento é tão satisfatório, que poucos resistem à tentação", lamentou Weizenbaum.

Joseph Weizenbaum nasceu em Berlim no ano de 1923, e em 1936 teve que emigrar com sua família, de origem judaica, para os Estados Unidos fugindo do regime nazista de Adolf Hitler. Nos Estados Unidos, já como estudante, Weizenbaum teve a oportunidade de assistir a uma palestra do cientista Albert Einstein, que também havia fugido da Alemanha no final de 1932.

"Desde então, e desde que Einstein assinou a declaração contra o armamentismo junto com o matemático e filósofo Bertrand Russell, em 1955, me converti em cientista dissidente, o que sou até hoje", afirmou o pacifista americano.

Falcão e o Deputado Roberto Jefferson.


Na verdadeira democracia é assim: indivíduos de todas as tendências convivem harmoniosamente, independente de malas, cuecas ou outros utensílios...

segunda-feira, agosto 08, 2005

O Direito a Ler

Por Richard Stallman

Este artigo foi publicado na edição de fevereiro de 1997
de Communications of the ACM (Volume 40, Number 2)

(de "The Road to Tycho" , uma coleção de artigos sobre os
antecedentes da Revolução Lunar, publicado em Luna City,
em 2096)

Para Dan Halbert, o caminho para Tycho começou na
faculdade, quando Lissa Lenz pediu seu computador
emprestado. O dela havia quebrado, e, a não ser que
ela conseguisse um outro emprestado, ela não conseguiria
terminar seu projeto bimestral. E não havia ninguém a quem
ela ousasse pedir isso, exceto Dan.

Isso deixou Dan num dilema. Ele tinha que ajuda-la,
mas se emprestasse seu computador, ela poderia ler seus
livros. Além do fato de que você pode ir para a prisão por
muitos anos por deixar alguém ler seus livros, a própria
idéia o chocou a príncipio. Como todos mais, lhe tinham
ensinado desde o primário que emprestar livros era algo
terrível e errado, algo que só piratas fariam.

E não havia muita chance de que a SPA - Software Protection
Authority - não o descubrisse. Na sua aula de software,
Dan havi aprendido que cada livro tinha embutido um
monitor de copyright que informava quando e onde ele era
lido, e por quem, para a Central de Licenciamento. (Eles
usavam essa informação para pegar piratas de leitura,
mas também para vender perfis de preferência de leitura
para vendedores.) Na próxima vez em que seu computador
estivesse conectado à rede, a Central de Licenciamento
iria saber. Ele, como dono do computador, receberia a dura
punição, por não ter feito os sacrifícios necessários para
evitar o crime.

Claro que Lissa não pretendia, necessariamente, ler seus
livros. Ele poderia quer o computador apenas para escrever
seu projeto. Mas Dan sabia que ela vinha de uma família
de classe média e mal podia arcar com as mensalidades,
quanto mais suas taxas de leitura. Ler os livros de Dan
poderia ser a única forma dela terminar o curso. (10%
dessas taxas iam para os pesquisadores que escreviam
os artigos; uma vez que Dan pensava em seguir carreira
acadêmica, ele tinha esperanças de que seus próprios
artigos de pesquisa, se fossem citados constantemente,
renderiam o suficiente para pagar seu financiamento.)

Mais tarde, Dan aprenderia que havia um tempo em que
qualquer pessoa poderia ir à biblioteca e ler artigos de
periódicos, e até mesmo livros, sem ter que pagar. Haviam
estudiosos independentes que liam milhares de páginas sem
permissões governamentais para uso de biblioteca. Mas
nos idos de 1990, editores tanto comerciais quanto
institucionais de periódicos começaram a cobrar pelo
acesso. Em 2047, bibliotecas oferecendo acesso gratuito
ao público para artigos acadêmicos eram uma lembrança
distante.

Havia formas, claro, de contornar a SPA e a Central de
Licenciamento. Eram, eles mesmos, ilegais. Dan havia
tido um colega na aula de software, Frank Martucci,
que havia obtido uma ferramenta ilegal de depuração,
a usava para pular o código monitor de copyright quando
lia livros. Mas ele contou a muitos amigos sobre isso,
e um deles o entregou à SPA por uma recompensa (estudantes
devedores eram facilmente tentados pela traição). Em 2047,
Frank estava na prisão, não por leitura pirata, mas por
possuir um depurador.

Dan iria aprender depois que havia um tempo em qualquer
pessoa podia ter ferramentas depuradoras. Havia até mesmo
ferramentas depuradoras gratuitas disponíveis em CD, ou que
podiam ser baixadas da rede. Mas usuários normais começaram
a usa-las para passar por cima dos monitores de copyright,
e, eventualmente, um juíz declarou que isso havia se
tornado seu uso principal na prática. Isso significava que
elas se tornaram ilegais. Os desenvolvedores de ferramentas
de depuração foram enviados para a prisão.

Programadores ainda precisavam de ferramentas de depuração,
claro, mas vendedores de depuradores em 2047 distribuiam
apenas cópias numeradas, e apenas para programadores
oficialmente licenciados e juramentados. O depurador que
Dan usou na aula de software era mantido atrás de uma
firewall especial, de forma que podia ser usado somente
para os exercícios da aula.

Também era possível passar por cima dos monitores de
copyright instalando um kernel modificado do sistema
operacional. Dan eventualmente descobriu sobre os kernels
livres, e mesmo sistemas operacionais inteiros livres,
que haviam existido por volta da virada do século. Mas
eles não eram somente ilegais, como os depuradores, você
não poderia instalar um mesmo que tivesse um, sem saber
a senha do administrador do seu computador. E nem o FBI
nem o Suporte da Microsoft lhe diriam qual ela é.

Dan concluiu que ele simplesmente não podia emprestar
seu computador para Lissa. Mas ele não podia se recusar a
ajuda-la, por que ele a amava. Cada chance de falar com ela
o deixava em êstase. E já que ela o havia escolhido para
ajuda-la, isso poderia significar que ela o amava também.

Dan resolveu o dilema fazendo algo ainda mais impensável:
ele emprestou seu computador a ela, e lhe disse sua
senha. Dessa forma, se Lissa lesse seus livros, a
Central de Licenciamento pensaria que ele os estava
lendo. Isso ainda era um crime, mas a SPA não ficaria
sabendo automaticamente sobre ele. Eles só saberiam se
Lissa o entregasse.

Claro, se a faculdade descobrisse que ele tinha dado
a Lissa sua própria senha, seria o fim para ambos
enquanto estudantes, não importa para que ela tivesse
usado essa senha. A política da faculdade era que
qualquer interferência com as formas que ela tinha de
monitorar o uso que os estudantes faziam do computador
era o suficiente para ação disciplinar. Não importava se
você havia feito qualquer coisa danosa, a ofensa tornava
difícil que os administradores verificassem o que você
estava fazendo. Eles assumiam que você estava fazendo
alguma outra coisa que era proibida, e eles não precisavam
saber o que era.

Alunos não eram expulsos por isso normalmente - não
diretamente. Ao invés disso eles eram banidos do sistema
de computadores da faculdade, e iriam, inevitavelmente,
ser reprovados em seus cursos.

Depois, Dan aprenderia que esse tipo de política
universitária havia começado apenas por volta dos
anos 1980, quando mais alunos começaram a usar os
computadores. Anteriormente, as universidades tinham
uma abordagem diferente para a disciplina; eles puniam
atividades que eram danosas, não aquelas que meramente
levantavam suspeitas.

Lissa não denunciou Dan para a SPA. Sua decisão de ajuda-la
levou ao casamento dos dois, e também os levou a questionar
o que eles tinham aprendido sobre pirataria enquanto
crianças. O casal começou a aprender sobre a história do
copyright, sobre a União Soviética e suas restrições para
cópias, e mesmo sobre a Constituição original dos Estados
Unidos. Eles se mudaram para Luna, onde eles encontraram
outros que, da mesma forma, haviam gravitado para longe
do longo braço da SPA. Quando o Levante de Tycho começou
em 2062, o direito universal de leitura rapidamente se
tornou um de seus objetivos centrais.


Nota do autor
=============

Esta nota foi atualizada em 2002.

O direito de leitura é uma batalha que está sendo travada
hoje. Embora ainda possa levar 50 anos para nossa forma
corrente de vida desaparecer na obscuridade, a maior parte
das leis e práticas descritas acima já foram propostas -
Ou pela administração Clinton, ou por editores.

Há uma excessão: a idéia de que o FBI e a Microsoft
terão a senha de administrador (root) dos computadores
pessoais. Isso é uma extrapolação do Clipper chip
e propostas similares da Administração Clinton, em
conjunto com uma tendência a longo prazo: sistemas de
computador estão mais e mais propensos a deixar o controle
a operadores remotos do que a pessoas propriamente usando
o sustema.

Mas nós estamos chegando muito próximos deste ponto. Em
2001, o senador Hollings, bancado pela Disney, propôs uma
lei chamada SSSCA que exigiria de cada novo computador
um sistema de restrição de cópias, o qual o usuário não
poderia ultrapassar.

Em 2001, os Estados Unidos propuseram que no tratado da
área de livre comércio das Américas (FTAA, Federal Trade
Area of the Americas) as mesmas regras fossem impostas a
todos os países do hemisfério ocidental. O FTAA é um dos
assim chamados tratados de "livre comércio" que na verdade
são desenvolvidos para dar às empresas mais poder sobre
governos democráticos; impôr leis como o Ato do Copyright
é típico de tal espírito. A Electronic Frotnier Foundation (http://www.eff.org/)
pede às pessoas que expliquem para outros governos porque
deveriam se opor ao plano.

A SPA, que na verdade quer dizer 'Software Publisher's
Association' (Associação dos Editores de Software), não
é, hoje, uma força policial oficial. Extra-oficialmente,
ela age como uma. Ela convida as pessoas a delatarem seus
colegas de trabalho e amigos; como a Administração Clinton,
ela advoga uma política de responsablidade coletiva na
qual donos de computadores devem ativamente endossar os
copyrights ou serem punidos.

A SPA está presentemente ameaçando pequenos provedores de
serviço para a Internet, exigindo que eles permitam que a
SPA monitore todos os usuários. A maioria dos provedores se
rende quando ameaçada, por que eles não podem arcar com a
batalha judicial. (Atlanta Journal-Constitution, 1 Oct 96,
D3.) Pelo menos um provedor, Community ConneXion em Oakland
CA, recusou a exigência e foi processado (https://www.c2.net/ispdc/).
Diz-se que a SPA
desistiu desse processo recentemente, mas eles certamente
continuarão sua campanha de várias outras formas.

As políticas de segurança de universidades descritas
acima não são imaginárias. Por exemplo, um computador
numa universidade na área de Chigago imprime esta mensagem
quando você efetua o log in (as aspas estão no original):

Este sistema é para uso apenas de usuários autorizados.
Indivíduos usando este sistema de computação sem permissão, ou
excedendo sua permissão estão sujeitos a terem toda a sua atividade
neste sistema monitorada e gravada pelo pessoal da administração. No
caso de monitoramento de individuos fazendo uso incorreto desse
sistema, ou no caso de manutenção do sistema, as atividades de
usuários autorizados também poderá ser monitorada. Qualquer um usando
o sistema expressamente consente com tal monitoramento, e é avisado de
que tal se monitoramento revelar possíveis evidências de atividades
ilegais, ou violação dos regulamentos da Universidade, a administração
pode fornecer a evidência de tais atividades para autoridades da
Universidade e/ou oficiais da lei. ¨

Esta é uma abordagem interessante para a Quarta Emenda [da
constituição dos EUA]: pressiona quase todas as pessoas a
concordarem, antecipadamente, a abdicar de seus direitos
sob a mesma.


Referências
===========

- The administration's "White Paper": Information Infrastructure Task
Force, Intellectual Property and the National Information
Infrastructure: The Report of the Working Group on Intellectual
Property Rights (1995).
- An explanation of the White Paper: The Copyright Grab, Pamela
Samuelson, Wired, Jan. 1996
(http://www.wired.com/wired/archive/4.01/white.paper_pr.html)
- Sold Out, James Boyle, New York Times, 31 March 1996
(http://www.ese.ogi.edu/sold.out.html)
- Public Data or Private Data, Washington Post, 4 Nov 1996
(http://wp2.washingtonpost.com/cgi-bin/displaySearch?WPlate+33653+%28database%26geneva%29%3Adescription%26and%2619961102%3Cevent%5Fdate)
- Union for the Public Domain (http://www.public-domain.org/): Uma
nova organização que pretende resistir e reverter a extensão exagerada
dos poderes da propriedade intelectual.


Outros textos
=============

- A Filosofia do Projeto GNU (http://www.gnu.org/philosophy/philosophy.pt.html)
- Proteção Contra Cópia: Apenas Diga Não, publicado na revista
Computer World.
(http://www.computerworld.com/cwi/story/0,1199,NAV47-68-84-91_STO49358,00.html)

As notas do autor falam sobre a batalha pelo direito de
ler e sobre a vigilância eletrônica. A batalha está se
iniciando agora; aqui temos links para dois artigos sobre
tecnologias sendo desenvolvidas agora para nos negar o
direito de ler.

- Electronic Publishing:
(http://www.zdnet.com/zdnn/stories/news/0,4586,2324939,00.html)
Um artigo sobre a distribuição
de livros em forma eletrônica e questões de copyright que
afetam o nosso direito de ler uma cópia.
- Books inside Computers:
(http://channels.microsoft.com/presspass/press/1999/Aug99/SeyboldPR.asp)
Software para controlar quem pode ler livros e documentos
em um PC.

A Cópia exata e distribuição desse artigo inteiro é
permitida em qualquer meio, desde que esta nota seja
preservada.

Copyright 1996 Richard Stallman

Traduzido por: João S. O. Bueno <gwidion@mpc.com.br>
Tradução autalizada por: Sérgio Vinícius <sergio@europanet.com.br>