segunda-feira, setembro 26, 2005

Cidadão ou Súdito?

por Alexandre Garcia
Publicado na Gazeta de Cuiabá - MT


Domingo cedo eu ia de táxi de Ipanema ao Aeroporto do
Galeão e, antes de entrar no túnel Rebouças, o
motorista festejou: "Estamos com sorte;o túnel está
aberto." Ainda pela madrugada, o túnel fechara mais
uma vez porque bandidos interrompem o tráfego para
roubar carros, armados de fuzis automáticos e
metralhadoras. Significativamente, o túnel passa
abaixo dos pés do Cristo Redentor... Na quinta-feira à
noite, eu havia feito uma Palestra no Hotel Sheraton,
em frente à favela do Vidigal, e até uma hora antes
não se sabia se a Avenida Niemeyer estaria bloqueada
ou não pelos tiroteios. Quando cobri a guerra no
Líbano, em 1982, não imaginei que iria encontrar
situação semelhante na Cidade Maravilhosa, em pleno
século 21. E como reage o governo? Tentando desarmar
as pessoas de bem, que têm armas para sua legítima
defesa.

Dos milhares de armas que as pessoas entregaram,
algumas caíram em mãos dos bandidos. Sabe-se de 83 dos
melhores exemplares - algumas já encontradas para
confirmar a troca de mãos. Não se sabe do resto. As
velhas, enferrujadas, das viúvas, já passaram pelo
rolo compressor. Diz-se que as armas estão sendo
recolhidas para que não caiam nas mãos dos bandidos...

Enquanto isso, em São Paulo, no bairro chique de
Itaim, quase 30 edifícios já foram assaltados sem
pressa. Os bandidos entram e ficam até seis horas a
vasculhar os apartamentos, com a confiança de que não
haverá reação porque, afinal, as pessoas não têm armas
para defender seus lares. No meu estado natal a gente
aprende que se nos agachamos, alguém vai acabar nos
montando.

Não vejo problema em implantar o maior rigor no
registro de armas. Exame de equilíbrio emocional, de
ficha policial e de adestramento no manejo da arma são
necessários. Mas não vejo por que impedir o cidadão de
exercer o elementar direito da legítima defesa. Além
disso, proibir venda de armas de nada vai adiantar,
porque o bandido não compra arma na loja, mas na ponta
do tráfico. Desarmar pessoas de bem não é vantagem
alguma. O Estado precisa é desarmar o bandido. Que, no
Brasil, não toma armas das residências das famílias
mas dos quartéis do Estado. As outras vêm do exterior,
no contrabando. Vamos gastar 600 milhões de reais com
o referendo. E se esse dinheiro fosse aplicado em
equipar e treinar policiais?

Pesquisa da semana passada mostra o pavor que impera
nas capitais. Em Belém, três em cada cinco famílias
declaram viver em área sujeita à violência ou
vandalismo. No Rio, duas em cada cinco. O índice menos
ruim é o de Brasília: uma em cada cinco famílias
declara-se moradora de área de risco para a segurança.
Vinte por cento! Nosso índice mais baixo de violência
deve ser parecido com o do Iraque, onde todo mundo
anda armado.

Aqui se mata mais, sem dúvida. Mais de cem por dia.
Nessa guerra, em vez de desarmar o atacante, tratamos
de desarmar a vítima.

Vai nos restar o carro blindado, a grade nas portas e
janelas, as câmeras de big-brother orwelliano, a folha
de pagamento dos seguranças, o colete à prova de
balas. E o medo. De que lado está o Estado? Se quiser
todos desarmados, que reforme a Justiça e a polícia,
para termos lei e segurança.



Brasileiro com medo não é cidadão; é súdito.

Um comentário:

Karina disse...

Concordo com o texto, mas se expomos nossa opinião somos chamadas de ridiculas, portanto é vir o referendo e cada um votar no que acredita. ;-)

bjos