quarta-feira, fevereiro 09, 2005

Como seria a vida em naves giratórias

Patrick Barry, Tony Phillips
Da Nasa

Da próxima vez que você for a um playground, tente o seguinte: leve uma bola e um amigo, e comece a andar no gira-gira. Tente jogar a bola para seu amigo por dentro do brinquedo, e veja se ele consegue agarrá-la nas primeiras tentativas.

Ele não conseguirá, com certeza. Na verdade, sua jogada irá bem longe. Você sentirá seu braço estranhamente empurrado para um lado conforme você arremessa, e, durante o "vôo", a bola se desviará um bocado.

Os físicos chamam isso de "efeito Coriolis", e ele acontece em qualquer plataforma giratória. Os furacões giram devido a esse efeito, tendo a Terra como plataforma giratória. Contrariamente à crença popular, as forças Coriolis não controlam a descarga do banheiro -a Terra não gira tão rápido. Mas jogar uma bola em um gira-gira definitivamente é uma experiência Coriolis.

Viagens espaciais são uma experiência Coriolis, também.


Bola jogada em gira-gira tem comportamento estranho. Clique na imagem para ver animação que demonstra o efeito.


Pesquisadores sabem há tempos que naves rotatórias como um gira-gira podem resolver um monte de problemas: na falta de gravidade, os ossos e músculos dos astronautas se enfraquem. É difícil comer e beber, e mesmo usar o banheiro. Dentro uma nave giratória, por outro lado, haveria uma gravidade artificial (devido às forças centrípedas) que manteria os corpos fortes e tornaria a vida cotidiana mais fácil.

O problema é que naves rotatórias também viriam com um forte efeito Coriolis. Objetos jogados mudariam de direção. Tentar chegar a um botão seria complicado, porque o dedo pousaria no local errado. Será que os astronautas se adaptariam a isso? E, caso sim, eles se adaptariam bem o suficiente para viver bem no arriscado ambiente espacial?

Isto é o que os pesquisadores James Lackner e Paul DiZio estão tentando descobrir. Com o apoio do Centro de Pesquisa Física e Biológica da Nasa, esses dois cientistas estão fazendo uma séria de experimentos com pessoas em câmeras rotatórias para entender o quão bem esses astronautas deveriam se ajustar à vida a bordo de naves assim. Eles também esperam encontrar técnicas de treinamento que possam ajudar a facilitar a transição de estados rotatórios para não-rotários, e vice-versa.


Concepção artística de uma nave rotatória. Clique para ver uma animação.

"Experiências feitas na década de 60 mostraram que as pessoas não se adaptam bem em rotação", diz Lackner, professor de Fisiologia. "Mas naqueles experimentos, os sujeitos não tinham objetivos bem definidos para seus movimentos. Descobrimos que quando um objetivo é dado, as pessoas se adaptam rapidamente."

Definidas ações (tais como atingir um certo alvo ou botão), as pessoas em seu estudo aprenderam a se mover de maneira correta depois de apenas 10 ou 20 tentativas. Um ajuste tão rápido surpreendeu os pesquisadores.

"Supomos que, quando um objetivo está presente", diz DiZio, professor-associado de Psicologia, "o cérebro dita o movimento desejado aos músculos muito precisamente. Desvios desse movimento são detectados mais prontamente pelo sensoreamento do cérebro."

Por que as pessoas têm essa habilidade natural de adaptação à rotação?

ossos corpos e cérebros devem ter evoluído, de certa forma, de acordo com o efeito Coriolis. Toda vez que você se vira e tenta atingir algo simultaneamente, você teve uma breve experiência Coriolis. Girando em uma cadeira de escritório. Jogando basquete. Rodando para descobrir o que fez aquele estranho barulho atrás de você. Em cada caso, seu cérebro faz ajustes em tempo real.


Uma sala rotatória usada por Lackner e DiZio em seus experimentos

Outras descobertas surpreenderam os pesquisadores, também. Por exemplo, depois de rodar por um instante, pessoas em seu estudo não mais percebiam o efeito Coriolis. O desvio de seus braços e pernas parecia desaparecer. Seus cérebros compensavam isso, então suas mentes não mais tomavam consciência do fenômeno.

Ainda mais estranho, quando as pessoas voltavam a um ambiente não-giratório, elas sentiam uma força Coriolis no sentido contrário. "É apenas um truque da mente", diz DiZio. Depois de outras 10 ou 20 tentativas de movimento em direção a um alvo, os cérebros deles se reajustam, e o efeito fantasma vai embora.

DiZio e Lackner descobriram que as pessoas podem se adaptar à velocidades rotacionais tão velozes quanto 25 rpm. Isso é tão rápido quanto as pessoas viram seus corpos durante o dia-a-dia. Para comparação, uma nave rotatória giraria muito mais lentamente, talvez 10 rpm, dependendo do tamanho e do design da nave.

Para exercer mais controle sobre as condições de seu experimento, os pesquisadores tentaram algo novo: simular o efeito Coriolis com um braço robótico. Pessoas sentadas tentariam fazer movimentos certos com seu braço enquanto o braço robótico gentilmente empurra seu pulso de modo a imitar o efeito Coriolis.

A vantagem desse modelo é que o braço robótico pode ser reprogramado para empurrar de maneiras diferentes, o que permite testar como as pessoas reagem em condições diferentes. Usando o braço, a dupla de pesquisadore descobriram que as pessoas podem se adaptar a uma pequena e variável força mesmo quano está mascarada por uma outra, maior e mais constante. Então, por exemplo, os astronautas poderiam se adaptar a um efeito Coriolis apesar de uma força constante de fundo, tal como um empurrão constante dos propulsores da nave.

Muitas questões permanecem sem resposta. Será que os resultados baseados em movimentos do braço se aplicam ao corpo todo? Carregar ferramentas pesadas faz alguma diferença? Depois de se adaptar, uma pessoa pode se readaptar mais facilmente? Qual a melhor maneira de treinar astronautas para a vida em uma casa que gira?

Lackner e DiZio planejam descobrir essas questões e mais à medida que a pesquisa continue nos próximos meses.

original: http://noticias.uol.com.br/inovacao/ultimas/ult762u2067.jhtm

Nenhum comentário: